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Perda gestacional e a falta de ressonância aos sentimentos de mulheres enlutadas

As mulheres que vivem uma perda gestacional costumam experimentar um duplo trauma. Primeiro, quando passam pela dolorosa experiência de perder um bebê. Segundo, quando não encontram reconhecimento para sua dor.

A perda de um bebê encerra uma experiência, abruptamente, numa violência impensável. Não raro ouvimos relatos desse momento como ir do céu ao inferno apenas em alguns segundos. A forma súbita dos acontecimentos expõe a mulher a momentos potencialmente traumáticos.

É preciso tempo para assimilar uma experiência tão brusca e inesperada, e consequentemente tão difícil de ser elaborada. A mulher necessita muito do apoio dos profissionais de saúde e de seus parentes e amigos próximos para superar essa vivência.

Porém, o entorno da mulher que perde um bebê costuma não reconhecer sua perda, ou então, tende a minimizá-la. Essa falta de eco aos seus sentimentos acaba prolongando seu luto e, por vezes, o tornando impossível de ser elaborado.

Por que não reconhecem sua dor?

Talvez, por dois motivos principais. Primeiro que em nossa cultura é muito comum associarem a intensidade do vínculo com o tempo de relacionamento. As mulheres que perdem seus bebês ainda nas primeiras semanas são as que acabam encontrando menos ressonância aos seus sentimentos. Segundo, porque ainda não reconhecem a gestante como “mãe”. Sendo assim, se não é mãe, então, não perdeu um filho.

No entanto, sabemos que com a gestação se iniciam transformações a passos largos na vida de uma mulher. As mudanças hormonais, psíquicas, em sua identidade e em seus relacionamentos, acontecem em uma velocidade tamanha, que nos mostram que a gravidez não é uma experiência PRÉVIA à maternidade, e sim, ela JÁ É o período onde acontecem suas primeiras vivências!

Portanto, essa falta de reconhecimento não corresponde à vivência de quem gestou.

Infelizmente o que acaba acontecendo é, por não encontrar ressonância aos seus sentimentos, a mulher passa a questionar sua experiência. Sua percepção da realidade fica fragilizada. A negação das pessoas na sua volta duplica o trauma, pois agride seu processo de simbolização, colocando em dúvida sua percepção da realidade.

Ela própria passa a não reconhecer essa experiência como um luto a ser vivido. Começa a acreditar que ela que é inadequada, sente-se então envergonhada e culpada por sentimentos tão fortes e, não raro, tem a sensação de estar enlouquecendo.

É um desamparo muito grande.

E assim, o tempo vai passando, a experiência e os sentimentos vão sendo reprimidos, abafados, até que quem está pela volta já não se lembra mais. Passou? Possivelmente não. Se o luto não é vivido e significado, isto é, simbolizado e colocado em seu devido lugar dentro da sua história de vida, a ferida vira e mexe vai abrir, aparecendo em forma de lembrança e sensações quando menos se espera.

Uma mulher gestando gesta mais que um bebê, gesta um vínculo, um amor, gesta seu projeto de vida. Portanto, não podemos negá-las o direito de viver seu luto pelas suas dolorosas perdas.

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